Faz hoje 526 anos que João II (r. 1481-1495), encontrando-se em Sintra, deu ordem régia ao município de Lisboa para que construísse, em Belém, uma estrutura de prevenção contra a entrada de doenças infecciosas (o documento pode ser consultado em João Silva Marques (ed.), Descobrimentos Portugueses, Lisboa, 1988, vol. 3, p. 459, doc. 299).
O objetivo destas construções era muito simples: sabendo que tanto os portugueses como os estrangeiros chegavam por mar de "lugares perigosos em que morrem de pestilência", e receando o "muito dano e dolo e perigo" que a doença poderia provocar, ordenou que se fizessem duas obras.
A primeira era uma cruz de pedra grande, em Santa Maria de Belém, "para que as naus que vierem de lugares perigosos não passarem da marca da cruz". E ordenou que se construísse um alpendre "no topo de uns pardieiros" para "assoalharem suas mercadorias e se recolherem neste alpendre".
Perante a pandemia de Covid-19, as nossas cruzes de pedra são as sinaléticas com a obrigatoriedade de se usar máscara e desinfetar mãos, que encontramos um pouco por todo o lado. E os alpendres talvez sejam os aeroportos, que, consoante o destino, continuam a impor certas restrições à liberdade de movimento dos cidadãos. Mas a forma mais moderna de se procurar controlar quem esteve em "lugares perigosos" talvez seja a nova app StayAway Covid, que pretende avisar os cidadãos se estiveram na proximidade de alguém infetado com o novo coronavírus.
Seis meses depois do entrada do SARS-CoV-2 em Portugal, ainda persistem as incertezas quanto ao presente (Será seguro viajar? Será seguro ir para a escola? Será seguro andar de transporte público? Será seguro ir a um festival de música ao ar livre?) e, sobretudo, em relação ao futuro (Será que as vacinas irão funcionar? Poderá a economia aguentar os constrangimentos ditados pela Covid-19? Serão os apoios europeus suficientes para resgatar a economia nacional? Será que a pandemia irá provocar uma ascensão do populismo, enfraquecendo os regimes democráticos?).
Por esse motivo, a iniciativa Pandemias e História na Era da Covid-19 continuará a efetuar o seu trabalho de entrevistar especialistas nas mais diversas áreas do saber: não em busca de respostas imediatas para os nossos problemas atuais, mas de uma perspetiva histórica que nos permita compreender as soluções que poderemos adotar.
O enfoque destas entrevistas irá ser alargado para a área da cultura e da literatura, através da colaboração da investigadora Sofia de Melo Araújo. Em breve haverá mais novidades.